sábado, 31 de março de 2012

Felicidade

"Acordar é fácil quando dormir é insuportável" ela disse enquanto soprava uma xícara de chá. Conversava pelo celular e atraiu a atenção dele. Esse foi o primeiro vislumbre que tivera do mundo tão particular daquela menina.
Ninguém sabia nada sobre ela. Endereço, conhecidos, gostos, manias; tudo era um enigma. Diziam que se chamava de Dalila, mas quem já havia tentado confirmar? Ela era um mistério, quase uma sombra, foi inevitável para ele se interessar. Então começou a observa-la.
Descobriu que sua cor favorita era marrom, seu livro preferido era Como me Tornei um Estúpido. Gostava de sanduíche de ricota com passas e não tomava café. Fazia psicologia mas amava mesmo a antropologia. Seu melhor amigo era o entregador da farmácia; sua melhor amiga, sua irmã e o porteiro do prédio onde morava era quase um pai. Tinha um cachorro chamado Lênin e era falante desde que se dirigissem a ela primeiro. Ele estava encantado.
Na primeira vez em que se falaram, estava chovendo. A menina andava na chuva como se dançasse quando ele esbarrou nela - que ofereceu seu guarda-chuva ("aceite, você pode ficar gripado"). Conversaram sobre Belle and Sebastian, banda que estampava as camisetas de ambos. A chuva parava ao mesmo tempo em que ele, de fato, se apaixonava.
Os dois almoçavam juntos e todos os dias passavam duas horas e meia deitados na grama lendo livros que recomendavam um para o outro. Faziam passeios ao zoológico e, vez ou outra, iam ao circo.
Moraram juntos, tiveram filhos, casaram-se ao ar livre, no exato momento em que o sol cedia lugar a noite.
Ela deixou de passar noites insones. Ele aprendeu a tomar chá com uma dose de whiskey. Brigavam. Discutiam mais do que qualquer um imaginava. Faziam guerras de comida na cozinha. Dividiram uma vida e uma biblioteca invejável.
E os dois foram felizes.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Aquele em que falo sobre minhas duas semanas de sonho.

Aos onze anos sonhava com a faculdade: iria fazer História (sem nenhum trocadilho patético). Eu podia ver minha vida de historiadora antes mesmo de conhecer essa palavra. Claro que aos doze anos, vi todo um mundo de possibilidades se abrir na minha frente, mas História sempre foi mais do que um desejo simples.
Aos dezoito-quase-dezenove ainda tinha aquela certeza inocente dos onze: queria História. Passar no vestibular foi tão único que deveria existir um adjetivo exclusivo para descrever.
Quando finalmente comecei o curso, tive medo. Um pouco de não gostar, muito de ter passado anos errada. Meu medo foi infundado. Duas semanas e já pude sentir na pele o que é ter cem páginas para ler em dois dias, o que é conviver com a estrutura um tanto quanto precária das universidades públicas (locais em que, atualmente, pretendo trabalhar - pretensão muito mais madura que trabalhar no Egito, sonho daquela menina da quinta série), senti o que é conhecer pessoas com a mesma paixão que você e outras com paixões muito mais hesitantes. Encontrei profissionais respeitáveis de várias áreas e me encontrei tão sedenta por conhecimento a ponto de ler as páginas pedidas e realizar pesquisas paralelas sobre tudo que parece minimamente interessante.
Estou amando cada segundo, cada pessoa que encontro e sobre quem leio, cada lugar. E, mais do que isso, estou descobrindo quem eu sou e o meu lugar na História (com o trocadilho patético).

sábado, 24 de março de 2012

Vida longa a eles!

Sempre acreditei em contos de fadas. Príncipes encantados, sonhos que se realizam, dragões que precisam ser derrotados, amizades eternas. Para mim, tudo sempre foi plausível.
Claro que não tenho mais idade para isso, mas a situação transforma toda a racionalidade em bobagem. Meus sonhos têm se realizado tantas vezes nesses últimos anos, meus dragões diários (ou vocês vão me dizer que seus medos e problemas não se parecem com dragões?) são contornados e - vez e outra, superados -, alguns sapos já apareceram e, acima de tudo, as amizades.
Por todas as minhas 19 primaveras, fui juntando conhecidos e alguns deles (as melhores pessoas que se pode conhecer) têm um quê de encantamento ao seu redor. Pessoas que, com um toque de mágica, transformam um dia terrível em um memorável, que lutam com dragões e fazem parecer fácil, que servem de exemplo de força, de inteligência, criatividade e talento. São esses os companheiros que quero manter em minha vida por todos os longos anos que - espero! - me aguardam.
Quero poder sentar com meus filhos e poder contar as histórias (porque tudo o que nos aconteceu foi real) com a Tia Amanda, a Tia Becca ("isso, filho, a mãe dos seus três amiguinhos que vêm brincar com você amanhã"), a Tia Lud, a Tia Camille ("isso, filhinha, a mãe da Jolie"), a Tia Palmeira ("mamãe, mamãe, você sabia que o nome dela é Thaís? Não é impressionante?"), o Tio Caio, o Tio Dudu. Quero que essas figuras incríveis conheçam minha casa, minha família e ainda estejam comigo no dia em que todos nós formos levados ao asilo. Quero ver a felicidade deles.
Então, amigos, prometam que ainda vão estar presentes em cada um dos momentos grandiosos dessa vida em que contos de fadas existem porque vocês estão presentes. Prometam que, mesmo que tudo mude, não vamos nos separar. E, por último, prometam que, se nos separarmos, contem aos seus filhos que são os amigos que transformam a fantasia em realidade, mostrem nossas fotos e digam a eles que amo vocês sinceramente (porque não vai ser a distância que vai mudar meus sentimentos).

sexta-feira, 23 de março de 2012

Diga adeus como se estivesse dizendo até logo;
Sofra por um dia;
Chore por três.
Levante a cabeça e siga em frente
Para quem sabe um dia amar outra vez.

Não foi sua aparência. Foram seus sorrisos, suas mensagens, suas ligações. Foi o seu jeito de me abraçar. Foi sua preocupação comigo - tão grande depois de tantos anos. Por falar nesses anos, não foram eles. Foi a sua voz, foram as histórias que me conta ao telefone.
Não foi o presente que você comprou, pelo menos não mais do que o chaveiro que você me roubou. Foi sua vida e o jeito que ela tem de combinar com a minha (e o fato dela ser tão diferente e irreal do ponto de vista do meu ponto de vista).
Além de tudo o que eu sei, foram os detalhes que ainda não descobri. E as coisas grandes que descubro todos os dias.
Foi por cada pedacinho de você que comecei a sentir algo tão inesperado que mal posso definir. E é por esses pedacinhos que não me atrevo a pedir nada a não ser o que você se dispõe a me entregar: sua amizade, sua atenção, suas ligações - em suma, coisas que já são infinitamente importantes para mim.

Necessário

Direi Adeus como jogo fora um pedaço de papel.
Me foi útil, me serviu de conforto.
Me machucou com as letras ali gravadas, verdades não ditas.
Desenhos descoloridos, rabiscados.
Dolorosamente difícil de me desfazer, mas necessário.
Despendi ali horas de devaneios a dois, eu e a caneta.
A meia luz, aos sussurros falei de amores e sonhos.
Inventei, criei, escrevi , descrevi.
Li e reli tantas vezes que se desgastou.
Passou o tempo e sua validade se findou.
Chegou a hora de dizer Adeus e agradecer por tudo o que passou.

quinta-feira, 22 de março de 2012

A Caixa

Guardei meu coração em uma caixa toda trabalhando de madeira envolta por correntes e cadeados. Deixei-a lá em seu canto escondida juntando poeira e histórias.
Até que você apareceu e achou minha caixa velha e surrada.
Limpaste-a, lustrou-a e poliu suas correntes e cadeados que nunca tentastes tirar. Afinal sempre estiveram lá não havia motivos para supor que ainda havia chaves capazes de abri-las.
Elas existem e estão como novas, minto estão acabadas, mas não esquecidas. Ainda servem a seu propósito de proteger meu coração que você pegou sem saber e cuidaste tão bem sem nenhuma ideia ter do conteúdo da caixa.
Cogitei a ideia de te entregar as chaves de maneiras anônimas, pequenos presentes. Mas tendo medo do que irás encontrar dentro da minha caixa e principalmente o que farás com seu conteúdo. Jogarias fora, devolveria para a caixa, cuidaria dele, usaria-o para adornar sua mesa? Tanto faz. Não o farei, não agora.
Obrigada por cuidar e continuar cuidando do meu coração mesmo que por acidente. Quem sabe um dia quando estiveres disponível e eu ganhar coragem não me apresento e te presenteie com as chaves do meu peito.
Mas engraçado como invadistes meus pensamentos, bagunçando-os, infligindo em mim sonhos ao teu lado, onde "Nós" é mais do que apenas eu e você.
Não é justo possuíres meu coração e invadires minha psique e não ter a mínima noção
de tal feito heróico.
Derrubastes todas minhas barreiras e infiltraste-se em mim sem talvez ter desejo de ficar e se estabelecer. Mas tua marca ali estará gravada em sua letrinha de menina romântica na tampa da minha caixa como uma etiqueta de propriedade.

domingo, 18 de março de 2012

Sobre amores repentinos, intensos e passageiros.

Mariana chegou atrasada e se sentou na cadeira vazia próxima ao interessantíssimo - até então - desconhecido Matheus.
Dez minutos bastaram: ela estava apaixonada. Como foi doce a noite em que conheceu Matheus!
Os dois conversaram e se deram tão bem que ela não pôde entender como pensou amar outro alguém. E sabia que ele gostara dela. Cada troca de olhares e cada um dos sorrisos só a encantavam mais e mais.
Dizer adeus doeu, mas foi uma dor doce. Quase como aquele momento em que se acorda mas o sonho ainda parece possível.
Ir para casa foi irreal, tudo parecia igual quando nada dentro dela o era.
Dormir foi impossível. Mariana dançava pelo quarto em silêncio, escrevia finais felizes para eles, fazia rimas de amor. Ela sabia que os dois funcionariam juntos, toda a pizzaria em que se encontraram testemunhara que sim.
Toda a semana que se seguiu foi um misto de saudade e doçura que se recusava a desaparecer da vida da menina.
E todo o ano seguinte foi como deveria ser: sem Matheus, sem encontros inesperados, sem corações exaltados por causa dele. O amor tão forte não tinha espaço na vida cotidiana, pertencia a uma noite perfeita.
E Mariana seguiu sem outros amores de uma noite só, seguiu e cresceu. Ser adulta não combinava com esses amores.
Mas, ah! Como foi doce a noite em que conheceu Matheus!

terça-feira, 13 de março de 2012

Minha pressa e minha prece.

Ver você. Tão lindo, tão diferente, tão seu (quando deveria ser meu).
Ver você. Meu coração disparado, minhas mãos suadas, o tempo parado.
Ver você. Você sorriu, conversamos por dez minutos (enquanto eu queria tão mais!), você se foi. E continuou dono do seu coração, enquanto se transformava em dono do meu (que ainda grita "Ame-me!").

segunda-feira, 12 de março de 2012

O beijo.

Um beijo mudou duas vidas inteiras.
Ele era todo fumaça. Outrora amigo, mudou sua natureza por ela.
Ela era fogo: não podia ser detida. Por isso ele se tornou um vestígio de tudo que poderiam ser: apenas o rastro dela; enquanto ela seguia em frente, destruindo, queimando.
Ele era alarde, era um indício de coisas melhores, mas ela preferia observar à distância, apreciar imagens embaçadas de outra vida.
Aquela menina era cruel, misteriosa, difícil. Possuía um coração partido que, justamente por estar partido, não sabia mais sentir. Tinha olhos escuros, bondosos e enganadores. Tinha um próprio universo. Era tão única que ele se perdeu em seus rodamoinhos de idéias e caiu de amores por ela.
Aquele menino não é mais o mesmo. Não é feliz, não faz o que costumava. Ainda não esquece por um minuto sequer aqueles olhos de Medusa que ela tem. E ela segue impiedosa. É mais que fogo - desejo e calor. É água. É uma torrente fria e forte. Nada a impede de ir, deixando tudo para trás, carregando os corações que quebrou pelo caminho.

Soneto de um Marujo


Em minha caravela perdida nos sete mares
A mercê de tempestades
Tento quase em vão ficar acima do mar
Enquanto ele tenta me tragar.

Me recuso a naufragar
A nadar, nadar e nem na areia chegar.
Rezo para Posseidon, Neptuno (quem ele hoje for) para me salvar
Não perecerei no mar.

Caso venha a esvaecer
Na mão das sereias há de ser
Com suas belas vozes me embalando

Escondendo suas verdadeiras formas, me velando.
Me seduzindo para seus braços
Onde morreria em seus abraços.

sexta-feira, 9 de março de 2012


Percebo querer mais. Adoro o que já temos, as longas conversas, os beijos doces, as coisas em comum, as diferenças de opinião, mais conversas, assuntos infinitos. Mas quero mais.
Quero-a para mim apenas, esconde-la do mundo como ser egoísta que sou. Guardaria-a para mim como a um tesouro incalculável.
Mas não a prenderei, longe disso. Deixaria-a livre como o vento, mas gostaria de correr ao seu lado, ser seu par.
O que são dúvidas e hesitações quando a vejo assim. Livre, solta em seu próprio mundo, em que me foi permitida breve entrada.
Sois complexa menina, como uma rosa de aroma e forma esplêndidas, mas com espinhos a lhe guardar.
Impotente, inútil, simplória é como me sinto perto de ti.